“Eu sou o coelho campal
Que em toda a parte faz cama
Anoiteço em Portugal
Amanheço em Espanha”
Esta quadra extraída da obra
literária «Contrabando, delito mas não
pecado» da autoria de Manuel Leal Freire, pedagogo, jurista, jornalista e
sei lá que mais, pessoa de trato fácil e discurso fluente, com quem tive o
prazer de privar, raiano, nascido em Bismula, concelho do Sabugal, encaixa na
perfeição na zona de intervenção do consórcio transfronteiriço das cidades amuralhadas
em que são partes o Município de Almeida e o Ayuntamiento de Ciudad Rodrigo
(Espanha\Salamanca), entidades gestoras da GR 80 – Rota das Cidades
Amuralhadas.
E é tanto assim que mal saímos de
Almeida e quase sem que nos dêmos conta, já estamos a pedalar em
território salamantino. Apenas os marcos de limite de fronteira e a linha de
água formada pela Ribeira dos Tourões (também pode ser Toirões e até é o mais
usual) deixam adivinhar que estamos em Espanha.
Inaugurada a 20 de Setembro, a GR
80 ou “Ruta de las Ciudades Amuralladas”, tem tudo para ser um itinerário
altamente concorrido, especialmente por praticantes de BTT.
Os seus 110 Km desenvolvem-se
por caminhos e veredas que foram outrora palco principal da Rota do Contrabando
que tinha o seu epicentro exactamente em toda a envolvente a Vilar Formoso. A
sul formando a chamada “raia seca” que incorporava os territórios da actual Reserva
Natural da Serra da Malcata e a norte, a partir de S. Pedro do Rio Seco, os territórios de “Cima-Coa” ou terra quente, onde a
Ribeira dos Tourões ocupa o lugar delimitador conjuntamente com o rio Águeda que, vindo da Serra das Mesas, traça a linha de
fronteira desde Escarigo\Figueira Castelo Rodrigo até
Barca de Alva.
Desde a inauguração, no passado
dia 20 de Setembro, por mais duas vezes calcorreei estes fabulosos trilhos.
No passado Domingo por iniciativa
da rapaziada da Covilhã.
Andava com alguma curiosidade em
percorrer esta GR em condições ditas normais, pois aquando da sua
inauguração deparei-me sempre com situações insusceptíveis de repetição. E
estou a falar das muitas porteiras que fomos encontrando ao longo de todo o
itinerário, sempre abertas. Situação que muito dificilmente se voltaria a
repetir.
E aquando da segunda passagem
encontrei de tudo um pouco: Porteiras fechadas apenas com um simples ferrolho,
porteiras abertas e porteiras de tal modo cerradas que pura e simplesmente inviabilizavam a
progressão.
Saindo de Almeida na direcção de
Vale de Coelha e depois de transposta a linha de fronteira delimitada pela Ribeira dos Toirões, que
nesta época do ano apresenta o seu leito completamente seco, a progressão
fez-se na direcção de Aldea del Obispo, Villar de Ciervo, Villar de
la Yegua,
Serranillo, de onde abordámos o Rio Águeda por trilho paralelo à "carretera" e fora
das marcas da GR, onde está localizado o famoso núcleo de gravuras rupestres de
Siega Verde e o seu Centro de Interpretação.
Vale bem uma visita.
Em pendente ascendente até
Castillejo de Martin Viejo, para uma longa paragem num café local, onde pudemos
degustar uma grande variedade de “pinchos”.
Altamente recomendável e a preços
convidativos.
Logo após Castillejo de Martin Viejo foi-nos oferecida a
possibilidade de observar quatro imponentes abutres num cenário único, de rara beleza.
Até Saelices el Chico a
progressão fez-se em horizontes de larga
beleza, onde as culturas forrageiras predominam e grandes manadas de bovinos
vagueiam.
No entanto a partir daqui as
coisas foram-se complicando.
Quase sem nos darmos conta
estávamos num daqueles cenários que mais parecia saído da série “Soldados da
Fortuna”: Rede de protecção, arame farpado, larga faixa de segurança, câmaras
de vigilância a denunciar apertado controlo, lagoas de água esverdeada … viaturas, pavilhões e outros edifícios em acentuada
degradação que se interceptavam com outros a demonstrar utilização e conforto. E tudo isto ao
longo de uns bons Kms.
Para complicar um pouco total
ausência de marcas identificadoras da GR e vedações a denunciar propriedade privada. Sem qualquer
alternativa que não fosse seguir em frente.
Afinal todo este aparato tem
justificação: Aqui se desenvolveu intensa exploração de urânio, cuja actividade
cessou em 2000 estando actualmente em fase de recuperação
ambiental, Será?
As marcas da GR só viríamos a
encontrá-las nos pilares da ponte ferroviária, sobre o rio Águeda, já muito próximo de Ciudad
Rodrigo.
A entrada em Ciudad Rodrigo
fez-se em sentido ascendente, pela Puerta de la Colada, até à Plaza Mayor.
De regresso a Almeida, pelo lado
sul, na direcção de Vilar Formoso, o trilho desenvolve-se sempre por largos
estradões de terra.
A paisagem vai-se alterando: As culturas forrageiras vão
progressivamente dando lugar ao montado de azinha e as manadas de bovinos substituídas por varas de porcos pretos (ibéricos), num cenário encantador e ternorento,
pois não raras vezes éramos abordados por estes simpáticos animais que mais não
pretendiam do que uma pequena guloseima.
Porteiras e mais porteiras,
algumas delas com os famosos "mata-burros" a simplificar a passagem.
Já depois de Gallegos de Argañan
e bem próximo de Fuentes de Oñoro novo imprevisto: Porteira seguida de corte do
trilho com recurso a vala e rede do tipo malha-sol, com cerca de 2 m de altura a não permitir
grandes veleidades.
Eu, como já sabia da sua existência, segui por
caminho alternativo, no que fui acompanhado por um pequeno grupo, mas os mais adiantados só a muito custo conseguiram transpor tal
obstáculo.
Em Vilar Formoso
novamente fora do trilho, mas desta vez por opção e de
novo em contacto com a Ribeira do Tourões. A partir daqui a paisagem vai sofrendo mutações: Os
largos estradões cessam dando origem a veredas onde predomina o carvalho negral, a
carrasqueira, a giesta e o pinheiro bravo, num cenário de grande beleza natural que se há-de prolongar
até S. Pedro do Rio Seco.
Depois foi rolar a bem rolar até Almeida.
O dia bttistico terminou em amena confraternização no
“Granitus” onde saciámos o apetite
Um público agradecimento à C.
Municipal de Almeida que de forma desinteressada nos facultou os
balneários do pavilhão desportivo onde nos foram disponibilizados banhos de
água quente.
P.S. - Como não podia deixar de ser finalizámos este dia "bttistico" com uma "ginginha da Amélinha"
Algumas fotos:
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